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Localização: Trás-Os-Montes, Portugal

quinta-feira, janeiro 19, 2006

Intuição, Obsessão e Instinto

O corpo serpenteado de sua esposa, as nádegas altivas manchadas de tentação, os seios que se erguiam em esbelto talhe, apenas podiam significar – traição. Infidelidade!
Abatia-se sobre Celestino uma demência crescente que lhe consumia as entranhas e conspurcava a alma. Sentia os olhos cintilantes, o brilho demoníaco, de outros homens pousarem no corpo provocatoriamente torneado de Helena, sua esposa.
Sem outro meio de conservar a razão intacta, Celestino mudou e reforçou as fechaduras de casa, apenas ficara uma chave, a sua.
Colocou grades de ferro, nas janelas de vidros fumados, que impossibilitavam qualquer entrada ou saída de corpos estranhos e olhares imundos.
Trancada, fechada em casa, no 7º andar da Rua da Misericórdia, Helena estaria segura, longe de pecados, luxúrias e devaneios sexuais.
Estaríamos, mais ou menos, por meados da Primavera, Celestino regressava do trabalho, quando deparou com o barulho atordoante de sirenes, bombeiros, ambulâncias e todo o tipo de frenesim infernal. Incêndio!
Chocado, possuído pelo pânico, corria, corria desenfreadamente. Ardia diabolicamente o 7º andar, ardia a sua casa. Ao que parece o incêndio teria deflagrado no apartamento vizinho. Acabado o sustento das chamas, Celestino subiu. Subiu ao 7º andar, onde apenas sobravam as marcas negras do fogo. Subiu e viu. Viu Helena carbonizada, mesclada no corpo do seu amante. Sentiu um alívio divino, não era culpa sua. Helena viveria a morte como morreu em vida, no Inferno. Celestino sentiu uma enorme piedade pela alma de Helena, ele que nunca imiscuíra o seu corpo com os desejos da carne.
Perplexo olhou em volta, do armário embutido na parede ficara apenas a estrutura, vislumbrou na parede, outrora encoberta pelas roupas, uma passagem para o apartamento vizinho. A passagem, adornada de cinzas, dos amantes!
Celestino nunca mais viria a casar, a sua companhia era tão-somente um cão, de seu nome Fidel.
Passados dois anos, mais coisa menos coisa, ao fatídico acontecimento, Celestino passeava o seu cão, pelo parque da cidade, ao inicio da noite. Noite de lua cheia. A sombra ténue das árvores dançava com a gélida aragem que se sentia na «espinha». Dança não raras vezes interrompida pelas cinzentas, embora pequenas, nuvens que encobriam a lua.
Ora precisamente numa dessa interrupções, aparece repentinamente um vulto. Ladrão da noite, de arma em punho pretendia assaltar Celestino. Fidel, amigo de correrias encontrava-se longe, pressentindo um terrível perigo para o seu dono, desata a correr desalmadamente. O ladrão dispara, um tiro impaciente, contra Celestino. O cão, fiel amigo, atravessa-se no caminho da bala impedindo o seu destino. O ladrão, esse fugiu.
Os últimos gemidos, latidos de dor, do cão emocionam Celestino, como se a dor fosse sua. «Cão amigo, um cão com sentimentos humanos», pensou Celestino.

4 Comments:

Blogger Mac Adame said...

E serão, esses sentimentos bons, sentimentos humanos?

2:27 da manhã  
Blogger Eu said...

Eu nem vou comentar o texto, não posso, limito-me a tentar aprender; mas queria sugerir uma mudança de layout - é que o preto desvaloriza, vulgariza e reparte a aparência com blogues paupérrimos

;)

10:47 da manhã  
Blogger Carlos Estroia said...

Retrata a história de um homem com sentimentos de animal (instinto reprimido)a que os humanos as vezes chamam de ser racional outras vezes crenças e outras ainda obcessão. Muitas vezes a ética (o bem do homem) é tratada como algo profundamente racional. O Fidel(cão) tinha mais ética que qualquer ser humano. O Fidel animal logo detentor de instinto, coisa que os humanos não tem (dizem alguns intelectuais),colocou o seu maior instinto o da auto-preservação em risco para ter uma atitude que depois chamamos de ética.

1:04 da tarde  
Blogger Conceição Paulino said...

uma boa narrativa de tristes vidas...
Bjocas e bom f.s

10:42 da tarde  

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