O guerreiro do coração (II)
O Beija-Flor dormia profundamente enquanto os seus sonhos o conduziam para espessas neblinas. Os sonhos viraram pesadelos. Sonhou que a sua amada nunca olharia para ele, que o rejeitaria. Abriu os olhos sobressaltado dos tormentos do sono. Por entre a rama dos arbustos uma luz verde rompia a escuridão.
O coração do Beija-Flor batia assustado, o medo espalhava-se em tremeliques de pânico por todo o corpo. A pequena luz verde parecia um dos olhos de um terrível predador, paralisado o Beija-Flor, escondido atrás de pequenas folhas, olhava hipnotizado para a luz. A luz desapareceu sorrateiramente entre a folhagem, naquela noite não adormeceu mais, ficando sempre de alerta, na escuridão mais assombrosa que tivera.
Amanheceu, o céu estava cinzento. «As nuvens são os pesadelos do céu», pensou. Voou, ainda possuído pelo medo, para ver aquela que amava. Margarida era aquela que amava. Tremia tanto que não conseguia exibir a sua plumagem. Por ali outro beija-flor tentava também cortejar Margarida. O Beija-flor tremia de medo, a sua única reacção foi fugir como um covarde quando o outro o desafiou. O Beija-Flor provavelmente perderia o amor de Margarida, certamente perderia o seu território.
Voou, bateu as asas até não poder mais. Chovia torrencialmente. O céu chorava com ele. Abrigou-se debaixo de um salgueiro, onde curaria o seu choro. «Passa o choro e o medo fica, que será de mim agora?» Felizmente conhecia a Srª Tartaruga, que era velha e sábia, que lhe daria um bom conselho como sempre fez. Enquanto caminhava pensou no Amor que tanto ambicionara e que de momento parecia um grande mal sem cura. A desventura que vivera retirou-lhe as ilusões que se derramavam em lágrimas. Sentimentos que outrora eram campo de sonhos coloridos murchavam numa agonia cruel. Uma agonia que torturava o espírito.
O sol começava a exibir timidamente os seus raios doirados. Passou por flores de camomila e sorveu o seu néctar, recuperou alguma alegria espiritual numa ténue sensação de leveza e relaxamento. Encontrou a Sr.ª Tartaruga a saborear o sol. Contou-lhe tudo que se passara. A Tartaruga muito calmamente disse-lhe:
A paciência é uma virtude, mas esperar não é sinónimo de passividade, esperar é treinar, é colocar todas as nossas energias para aprendermos, é treinar com persistência para quando chegar o momento certo estarmos preparados para agir.
Amor e paciência são o lento caminho da sabedoria. O medo é mais rápido que o amor. Se as raízes do medo infectarem o teu coração, tu destruirás aquilo que estiver à tua volta e acabarás também por te autodestruir. O amor é delicado precisa de atenção e carinho. O amor é como a flor, é pelo beijo que absorvemos o seu néctar. Não te podes deixar dominar pelo medo, tens que cultivar a coragem.
A Srª Tartaruga era muito velha, falava de um modo muito confuso. O Beija- Flor não compreendeu tudo mas sabia que tinha de ser corajoso, que não podia desistir, não podia deixar que o medo o dominasse. Lembrou-se que quanto mais tinha julgado Margarida mais se tinha afastado do amor e mais se aproximara do medo e do ódio. Quem ama não pode ser indiferente à guerra. Guerra contra o medo, contra o ódio. É preciso coragem para amar.
O sol brilhava. Esperar é que o Beija-Flor não queria, tentou a sorte, escavou a terra procurando um tesouro que aparece-se por acaso, um tesouro que fizesse do riso uma coisa vulgar, que trouxesse uma felicidade eterna. Escavou com toda a força, com tanta força, que cortou o rabo a uma minhoca. Ficou assustado, olhou com pena para a minhoca, olhou intensamente e viu que esta se regenerava lentamente, compreendeu, naquele momento, um pouco melhor as palavras da tartaruga.
Ao sol um pavão exibia as suas lindas penas, a seu lado um insecto sem qualquer brilho. « Se tivesse as penas do pavão talvez Margarida me amasse.», pensou.
Entardecia lentamente, o Beija-Flor voou até ao cume do cipreste, sentia-se alto e seguro, dali teria coragem para enfrentar a luz verde. O vento do Norte trouxe uma noite fria e estrelada.
O Beija-Flor permaneceu sempre acordado, com um pouco de medo e ansiedade é certo, mas com a coragem necessária para ver aquela misteriosa luz verde que começava a reluzir entre a folhagem. Respirou fundo, encheu o peito de coragem e voou até se aproximar o suficiente para desvendar o mistério. Era um simples insecto, inofensivo, que reluzia. O Beija-Flor perguntou-lhe o nome e este respondeu: «Pirilampo.»
O Beija-Flor estava orgulhoso da sua coragem. O medo por vezes deturpa-nos a vista. Talvez Margarida não se apaixone só pela vista. Adormeceu navegando pelo mundo dos sonhos. Amanhã seria um óptimo dia para começar o seu treino.
(continua)
O coração do Beija-Flor batia assustado, o medo espalhava-se em tremeliques de pânico por todo o corpo. A pequena luz verde parecia um dos olhos de um terrível predador, paralisado o Beija-Flor, escondido atrás de pequenas folhas, olhava hipnotizado para a luz. A luz desapareceu sorrateiramente entre a folhagem, naquela noite não adormeceu mais, ficando sempre de alerta, na escuridão mais assombrosa que tivera.
Amanheceu, o céu estava cinzento. «As nuvens são os pesadelos do céu», pensou. Voou, ainda possuído pelo medo, para ver aquela que amava. Margarida era aquela que amava. Tremia tanto que não conseguia exibir a sua plumagem. Por ali outro beija-flor tentava também cortejar Margarida. O Beija-flor tremia de medo, a sua única reacção foi fugir como um covarde quando o outro o desafiou. O Beija-Flor provavelmente perderia o amor de Margarida, certamente perderia o seu território.
Voou, bateu as asas até não poder mais. Chovia torrencialmente. O céu chorava com ele. Abrigou-se debaixo de um salgueiro, onde curaria o seu choro. «Passa o choro e o medo fica, que será de mim agora?» Felizmente conhecia a Srª Tartaruga, que era velha e sábia, que lhe daria um bom conselho como sempre fez. Enquanto caminhava pensou no Amor que tanto ambicionara e que de momento parecia um grande mal sem cura. A desventura que vivera retirou-lhe as ilusões que se derramavam em lágrimas. Sentimentos que outrora eram campo de sonhos coloridos murchavam numa agonia cruel. Uma agonia que torturava o espírito.
O sol começava a exibir timidamente os seus raios doirados. Passou por flores de camomila e sorveu o seu néctar, recuperou alguma alegria espiritual numa ténue sensação de leveza e relaxamento. Encontrou a Sr.ª Tartaruga a saborear o sol. Contou-lhe tudo que se passara. A Tartaruga muito calmamente disse-lhe:
A paciência é uma virtude, mas esperar não é sinónimo de passividade, esperar é treinar, é colocar todas as nossas energias para aprendermos, é treinar com persistência para quando chegar o momento certo estarmos preparados para agir.
Amor e paciência são o lento caminho da sabedoria. O medo é mais rápido que o amor. Se as raízes do medo infectarem o teu coração, tu destruirás aquilo que estiver à tua volta e acabarás também por te autodestruir. O amor é delicado precisa de atenção e carinho. O amor é como a flor, é pelo beijo que absorvemos o seu néctar. Não te podes deixar dominar pelo medo, tens que cultivar a coragem.
A Srª Tartaruga era muito velha, falava de um modo muito confuso. O Beija- Flor não compreendeu tudo mas sabia que tinha de ser corajoso, que não podia desistir, não podia deixar que o medo o dominasse. Lembrou-se que quanto mais tinha julgado Margarida mais se tinha afastado do amor e mais se aproximara do medo e do ódio. Quem ama não pode ser indiferente à guerra. Guerra contra o medo, contra o ódio. É preciso coragem para amar.
O sol brilhava. Esperar é que o Beija-Flor não queria, tentou a sorte, escavou a terra procurando um tesouro que aparece-se por acaso, um tesouro que fizesse do riso uma coisa vulgar, que trouxesse uma felicidade eterna. Escavou com toda a força, com tanta força, que cortou o rabo a uma minhoca. Ficou assustado, olhou com pena para a minhoca, olhou intensamente e viu que esta se regenerava lentamente, compreendeu, naquele momento, um pouco melhor as palavras da tartaruga.
Ao sol um pavão exibia as suas lindas penas, a seu lado um insecto sem qualquer brilho. « Se tivesse as penas do pavão talvez Margarida me amasse.», pensou.
Entardecia lentamente, o Beija-Flor voou até ao cume do cipreste, sentia-se alto e seguro, dali teria coragem para enfrentar a luz verde. O vento do Norte trouxe uma noite fria e estrelada.
O Beija-Flor permaneceu sempre acordado, com um pouco de medo e ansiedade é certo, mas com a coragem necessária para ver aquela misteriosa luz verde que começava a reluzir entre a folhagem. Respirou fundo, encheu o peito de coragem e voou até se aproximar o suficiente para desvendar o mistério. Era um simples insecto, inofensivo, que reluzia. O Beija-Flor perguntou-lhe o nome e este respondeu: «Pirilampo.»
O Beija-Flor estava orgulhoso da sua coragem. O medo por vezes deturpa-nos a vista. Talvez Margarida não se apaixone só pela vista. Adormeceu navegando pelo mundo dos sonhos. Amanhã seria um óptimo dia para começar o seu treino.
(continua)
21 Comments:
é impressionante como estes textos me fazem ver cores, cheirar aromas e ouvir os passarinhos
(tb fazem doer um bocadinho, mas faz parte da magia)
(cada texto teu lembra sempre um autor de quem Eu gosto muito, q m "obriga" a ler coisas mais sérias que aquelas q costumo ler...
chama-se carlos estroia, conheces?)
.....coragem para continuares, belas cores mesmo quando receosas.....
Abraço!
este beija-flor também precisa de beijar uma flor de tom certo que lhe retire a timidez e provoque auto-confiança. Vamos a uns palpites?...
Há árvores que transmitem energias especificas - vou ver o que se arranja aqui por Sintra .
tem um bom dia! também gosto de escrever histórias, ao serão qd já está sossegado ou de manhã cedo. Por isso acho óptimo o blog, que me obriga a mexer ideias e procurar textos, ideias novas.
Eu kero saber o fim, eu kero... Tou a gostar tt =P
Sorrisos com beijos
Enquanto leio...viajo...
É impreesionante como as palavras deixam todos os sentidos à flor da pele...
Um beijo terno...
Olá... não percebi bem se o teu objectivo é um conto infantil ou uma metáfora para adultos...os objectivos e as formas de escrever são diferentes consoante aquilo que se pretende. Preferia que fosse infantil e então a linguagem deveria ser diferente. Sendo para adultos eu evitaria expressões como a Sra Tartaruga... são opiniões...
Beijocas
Bom. Mas continuemos aguardando pelo final...
água sim....C.
água que deixa no Piano....e que eu bebo...a sorrir.
obrigado.
beijos.
A princípio pensei que a luzinha verde fosse os olhos dum beija-flor extra-terrestre, mas se fugiu deve ter percebido mesmo que não era beija-flor pra andar em combates por qualquer Margarida…
A Srª.Tartaruga foi exímia na sabedoria. Amor e paciência e afastar o medo, para cultivar a coragem. A Margarida, afinal, merece o seu esforço para se tornar um herói e o pirilampo deu-lhe a prova de que não iria deixar ficar mal o seu próprio orgulho. Nem a sua amada!...
ora vamos então seguir as venturas e desventuras do beija-flor e aprender com ele algumas lições. Bom f.s. Bj e ;)
..."Adormeceu no mundo dos sonhos"...
Bom dia
Hoje com um sorrizo
beija flor é corajoso...
a tua escrita é "de quem sabe escrever", e sei que entendes o que eu quero dizer... é que por aqui na blogo há muitos...
espaço a visitar mais vezes...
... há comentários que valem um post, um blog...
Eu desafio os amigos a partilhar os pensamentos (pequenos, formato post e bilingue), desta feita sobre "o que é escrever", num próximo serás convidado,
cumprimentos
Espero que ele queira ser ele mesmo acima de tudo!
Li a outra parte também (embora de forma diagonal) e tens aqui uma prosa bastante descritiva no que diz respeito à imaginação visual!!!
:)
(Obrigada pela visita!)
Esta tua fábula é uma verdadeira lição de coragem, de amor. Sábias palavras as da Srª Tartaruga...
Gosto da forma fluente como escreves. Se ainda não aconteceu, deves arriscar a publicação em papel.
Bom fim-de-semana e boa escrita.
bom dia , carlos.
encontrei a faia e a genciana para os fins que me perguntavas. óptima dissertação sobre as cores. hoje estou em tons laranja, para aquecer o ambiente. Bom fim de semana!
Vengo a felicitarte por la exhaustiva descripción que haces de la poesía en el blog de Mitxu.
Me ha parecido perfecta. Abrazo.
Volveré con más tiempo a tu blog.
olá Sátiro....:)
beijos. por te merecer tanta leitura. atenta. o que não acontece sempre....:)
bom domingo. ao alto deste País.
Eu estou como o EU, estes textos agradam-me muito especialmente porque me fazem lembrar sempre um bom autor: o Carlos Estroia!
Obrigada Estroia
Precioso texto.
De dónde eres amigo?
Saludos.
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